Escuta aí: quando os autistas falam por si
Vozes autistas estão emergindo do silêncio. Será que as pessoas querem ouvir?
Não vou dizer que fui às lágrimas lendo isso, mas foi quase. Mais do que ler sobre autismo, eu gosto muito de ler o que escrevem os autistas sobre a sua experiência – nada é mais instrutivo para quem trabalha na clínica. Deparei com este artigo, publicado recentemente no Pediatrics e ele me emocionou, por isso resolvi compartilhar. É um chamado, um alerta, um puxão de orelha e um holofote sobre a discrepância que separa as perspectivas deles e nossas. Eu vou parar de falar e deixar a Jace contar para vocês. São lições valiosas.
Eu não falo. Posso dizer algumas coisas, mas não de forma consistente e nem sempre da forma que pretendo. Essa é parte da razão pela qual fui diagnosticada com autismo. Eu odiava esse diagnóstico até recentemente, porque sentia que o rótulo sugeria que eu não era inteligente. Há muito que luto com a forma como o autismo é apresentado: uma doença ou problema a ser resolvido. Mas vejo o autismo como tendo um cérebro e um corpo que funcionam de maneira diferente. Digo à minha mãe o que os médicos precisam me ajudar, e nunca é meu autismo. É refluxo e gases, ansiedade e mania – sintomas com os quais muitos lidam.
Um puxão de orelha na terminologia:
O que causou ainda mais confusão foi ser rotulada de “não-verbal”. Esse rótulo parecia, para mim, como se as pessoas pensassem que eu era incapaz de entender a linguagem. Mas compreender a linguagem nunca foi um problema para mim. É com conversar que tenho dificuldade, como milhões de outras pessoas autistas inteligentes. As dificuldades para falar não devem ser vistas como falta de inteligência, sentimento ou carinho.
E, claro, um alerta sobre “tratamentos”:
Fico aterrorizada ao pensar em todas as famílias buscando freneticamente tratamentos desejados, muitos deles sem nenhuma base em evidências. Lembro-me de como foi isso, e foi um pesadelo; o preço tanto para mim quanto para minha família. Nossas vidas foram sobrecarregadas por pessoas que apresentavam novas terapias e novas dietas. Senti que o foco não era tornar jovens autistas como eu felizes, calmos ou posicionados para ter sucesso em nossos próprios termos. Em vez disso, estavam me fazendo encaixar na concepção de “normal” de outra pessoa.
…Todo o meu tempo odiando aqueles cartões miseráveis nas sessões de fono poderia ter sido poupado se alguém tivesse me ensinado a olhar e apontar. Em vez disso, as pessoas estavam me ensinando o que era um cavalo – É CLARO QUE EU SABIA O QUE ERA UM CAVALO!
Sobre pensar nas potenciais barreiras motoras e presumir competência:
Por exemplo, considere terapia da fala que pedem às crianças que digam o nome de alguma coisa específica ou apontem para uma imagem específica, muitas vezes assumindo que aqueles que não conseguem simplesmente não entendem e não conseguem entender. Mas dizer ou apontar pode exigir habilidades motoras que muitos de nós não possuímos. Reserve um tempo para nos ajudar a olhar e apontar melhor ou presuma competência; presuma que os jovens autistas conhecem as imagens e nos ajudem a encontrar nossas vozes através de qualquer modo de comunicação que funcione melhor para nós. Posso atestar a diferença que isso faz.
Viradas de chave vêm na mão daqueles que acreditam:
Os verdadeiros pontos de virada na minha vida ocorreram quando as pessoas presumiram a minha competência e procuraram novas formas de ouvir (e escutar) a minha voz. Na primeira série, minha AT percebeu que eu poderia escrever com a ajuda dela. Estávamos lendo sobre borboletas e ela começou a me fazer perguntas. Peguei um lápis, ela emoldurou minha mão e de repente pude me comunicar! Escrevi sobre tudo e tive uma participação significativa no ensino fundamental. O trabalho fácil e enfadonho foi substituído pela álgebra e pela oceanografia. Todos finalmente entenderam que eu queria que falassem comigo como qualquer outra criança, que eu tinha voz. Chega de conversas irritantes e infantilizadas por parte dos adultos... que alívio!
E, para terminar, uma chamadinha à empatia que deveria governar as atitudes de todos profissionais:
Por fim, quero destacar que empatia é tudo. Os médicos e profissionais de saúde que mais me ajudaram são os que melhor me viram e ouviram. Eles me trataram com respeito e ouviram minhas preocupações e ideias, apesar de muitos deles não estarem acostumados a se comunicar com pessoas que não falam. Eles presumiram minha competência e trataram os sintomas que mais importavam para mim (como dor de barriga, ansiedade e mania). A empatia é fundamental para garantir que os não falantes recebam os cuidados de que necessitam. Ouça nossas vozes; precisamos ser ouvidos!
Pooley JE. Listen Up: Autistic Youth Need to Be Heard. Pediatrics. 2025;155(1):e2024069175